segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Instigada pela insatisfação conjugal (Renata Lima)


Nossa Avaliação - 6.0
O livro pergunta  já na capa: "Quais são os limites do desejo?" Mas eu proponho duas novas perguntas a vocês: até onde uma pessoa pode ir quando está insatisfeita no casamento? O que leva uma pessoa a levar uma vida dupla?

Já nas primeiras páginas descobrimos que a mãe da personagem principal, que não tem seu nome revelado em momento algum do livro, encontrou nas coisas da filha desaparecida há doze meses um manuscrito que ela estava escrevendo como se fosse um diário.

A polícia encerrou o caso como suicídio quando o carro da mulher foi encontrado em um penhasco e não havia nenhum objeto roubado ou sinal de luta, mas a mãe não sabe exatamente no que acreditar, principalmente depois de ter lido o manuscrito e descoberto uma outra faceta da filha, um lado escuro, devasso e insatisfeito que quer vir à tona. Ela acredita que era o desejo da filha ver esse livro publicado e portanto está disposta a fazê-lo.

E é assim que conhecemos a vida de uma mulher que abandonou o magistério para ser esposa em tempo integral, dedicada ao marido Cole (restaurador de obras de arte que vive viajando) de quem recebe uma mesada de quase mil libras por mês. Eles têm uma vida interessante, mas aos poucos começa a sentir falta de um pouco de emoção, de um sexo verdadeiramente alucinante e começa a apontar "defeitos" no marido que nunca sabe tocá-la direito ou fazer o que ela gosta. Resumindo: ela se descobre uma mulher acomodada e insatisfeita com a vida.

Tudo muda, porém, quando ela começa a desconfiar que o marido e sua melhor amiga Théo têm um caso amoroso. E uma passagem que achei muito interessante nessa exata parte do livro e que preciso destacar pois eu acho que é essa parte que faz com que ela busque a si mesma e, consequentemente, é onde o livro tem seu ponto de virada: 
"O oposto do amor não é o ódio, é a indiferença. Indiferença emocional, indiferença física. No seu âmago impera um vazio, uma solidão, um silêncio quando um dos dois vai para a cama sem se despedir, quando comem juntos sem falar, quando o telefone é passado ao outro sem uma palavra. Um vazio quando todas as noites ela deita na cama de casal, inquietantemente desperta, espantada com a facilidade com que o ódio consegue roçar o amor, cercá-lo sorrateiramente como um gato. Um vazio quando percebe que a maior solidão que sentiu na vida é no casamento, no papel de esposa."
A jornada da mulher não é uma jornada pelo sadomasoquismo, apesar de palavras fortes, como "cú", "porra" etc, as cenas de sexo não são cenas a la "Cinquenta Tons". Esse livro é um pouco mais obscuro, um pouco mais maduro e eu diria até um pouco mais interessante porque a protagonista não quer continuar na sua vidinha medíocre.

A narração é feita pelo ponto de vista da mulher, mas não em primeira pessoa, às vezes deixando a gente com aquela sensação estranha de quando uma pessoa chama a si mesma pelo nome como se estivesse falando de outra pessoa, sabe? Se fosse um diário, dificilmente alguém o escreveria dessa forma. Mas, na verdade, eu acho que não é um diário, é um livro sobre a liberação feminina, sobre a revolução sexual, mesmo que tardia, de uma mulher que achava que poderia se encaixar no estereótipo de mãe e esposa sem ter vivido plenamente sua vida e por isso ela escreve com o certo afastamento de alguém vendo suas próprias ações por outro ângulo, se questionando o tempo todo até que ponto uma pessoa pode ir em busca de si mesma.

A Leya tem se mostrado uma editora exemplar no que diz respeito aos livros que vem publicando. Assim como As Crônicas de Gelo e Fogo, esse livro é bem diagramado, bem traduzido e bem revisado, o que por si só já é um diferencial enorme, tendo em vista a enorme quantidade de erros que encontramos nos livros de outras editoras.



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