segunda-feira, 16 de junho de 2014

Quebrando o silêncio sobre o Holocausto (Renata Lima)


O mês de junho começou e com ele vieram os novos Desafios. O do Skoob é ler um livro de um autor brasileiro (englobando contemporâneos), o desafio principal do Desafio das Estrelas é ler um livro sobre guerra como tema. Hoje venho falar com vocês sobre dois livros que eu li nessa primeira semana de junho: "Estrela Amarela" de Jennifer Roy e "Depois de Auschwitz" de Eva Schloss que vem a ser a meia-irmã da famosa e corajosa Anne Frank do livro "O Diário de Anne Frank", que sobreviveu ao Holocausto e, assim como Sylvia Perlmutter, a narradora do primeiro livro, resolveu, já na velhice, finalmente falar sobre as experiências traumáticas vividas pouco antes, durante e depois da Segunda Guerra Mundial.

O que me impressionou nos dois livros, assim como nos outros livros sobre o Holocausto que eu tenho lido ultimamente, é o fato de que as pessoas ficaram anos e anos em silêncio sobre um assunto tão pertinente, mas os motivos são óbvios. Como se supera o trauma de ser desconectado de tudo que você conhece, de todos que ama, da vida que você tem, de uma hora para outra por causa da sua religião, da sua nacionalidade, da cor da sua pele, de alguma característica marcante do seu rosto? Há de se digerir tudo que se passou antes de colocar para fora e no caso dos livros abaixo, foi necessário quase meio século para que tudo fosse digerido para ser, finalmente, colocado para fora. 

Nossa Avaliação: 8.5
Em "Estrela Amarela", a tia idosa da autora do livro, Jennifer Roy, se chama Sylvia Perlmutter e durante muito tempo, Sylvia permaneceu em silêncio e nunca falou para ninguém o que ela e sua família passaram nos seis anos que as tropas de Hitler ocuparam a cidade em que viviam e os isolaram em um gueto chamado Lodz.

Tantos anos de silêncio, porém, se rompem quando a tia finalmente decide contar sua história e foi através das gravações das conversas que a autora decidiu, depois de muito lutar com o estilo da narrativa, escrever o livro em primeira pessoa, utilizando a voz da própria tia quando criança para narrar como era a vida antes e como ficou depois da invasão alemã à Polônia.

Aos quatro anos de idade, notamos que a inocência de Sylvia não permite que ela compreenda o que está acontecendo no mundo. Ela só sabe que há uma tensão quase palpável no ar, embora não veja motivos para isso.

Depois de tentar em vão uma mudança para Varsóvia, a família de Sylvia precisa retornar a Lodz e uma vez lá são obrigados a deixar aquilo que chamam de lar para trás e se amontoarem com outras famílias no gueto da cidade, em um apartamento mínimo e com banheiro compartilhado. A partir desse momento, vamos notando que os acontecimentos históricos vão dando ritmo à narrativa e cada vitória ou derrota do exército de Hitler tem novos desdobramentos dentro do gueto, sendo os mais impactantes a separação dos pais e dos filhos e os trens que deixam o gueto com trabalhadores que ao chegarem ao seu destino descobrirão que não estão indo para os campos de trabalho, mas para os campos de concentração e extermínio.

Com inúmeras escapadas fenomenais da morte, a família de Sylvia sobrevive, mas não sem sequelas desse que foi um momento tão feio que vai manchar a história da Humanidade para todo o sempre.

O livro é bem curtinho, com apenas 144 páginas, e, apesar da narrativa ser muito boa e interessante, não gostei muito do fato de ela ser quase dividida em tópicos curtos. Acho que ficaria melhor se a narração fosse contínua e fechada em capítulos, mas essa é só uma impressão minha e isso não dificulta ou prejudica a leitura de forma alguma. Acredito até que quem lê pouco vai gostar da narrativa mais fragmentada.

A capa do livro é interessante, o título tem tudo a ver com o livro porque os judeus eram obrigados a exibir a estrela amarela do judaísmo nos casacos. Para uns andar com a estrela era quase ostentar "a marca de Caim" ou o símbolo da vergonha, enquanto para outros foi uma benção e um orgulho e, para muitos, foi uma salvação.

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Se o relato do livro anterior é mais fragmentado e rápido, o relato desse livro, feito também em primeira pessoa por Eva Schloss, é mais completo e eu diria que até mais cruel. O interessante é que a autora diz logo no início que um dia foi convidada a falar sobre a meia-irmã Anne Frank em um palco e quando começou a falar, não conseguiu mais parar e até hoje ela não se lembra exatamente tudo que disse naquela ocasião, mas acredita ter sido algo muito relevante porque foi a partir daí que ela começou a ser convidada para falar sobre os horrores do Holocausto em vários locais, mas principalmente nas escolas.

Em "Depois de Auschwitz", a autora narra a história de sua família e amigos e impressiona ao mostrar como de uma hora para outra a propaganda nazista fez com que colegas de escola se virassem contra as colegas judias, como os judeus foram humilhados, maltratados e agredidos nas ruas de Viena, como tiveram que fugir em massa, como um êxodo, procurando refúgio em países vizinhos e até em países distantes, como a Austrália.

Eva Schloss, ainda criança, quando sua mãe ainda não tinha se casado com o pai de Anne Frank, se vê com seu pai, sua mãe e seu irmão vivendo uma vida normal quando é confrontada com uma dura realidade e tirada de sua situação de conforto para viver em constante estado de tensão.

Renegados por vizinhos e com medo da iminente invasão de suas casas, Eva e seus familiares fogem, passam por situações difíceis e precisam se separar: o pai de Eva consegue um visto de trabalho na Holanda enquanto ela e o restante da família ficam na Bélgica, onde alguns se aproveitam da situação de que eles são judeus, e portanto marginalizados pela sociedade, para assediá-los.

Quando o pai de Eva finalmente consegue levar a família para junto de si, em Amsterdã, a vida parece que vai voltar ao que era antes e é então que Eva conhece Anne Frank, descrita por ela como uma menina vaidosa e bonita, enquanto Eva é uma moleca. Mas a calmaria não dura para sempre e meses depois eclode a Segunda Guerra e os judeus passam a ser caçados e trancados em campos de concentração como o temido Auschwitz que ilustra a capa do livro.

Apesar de saber que não há como dar spoiler de tanto que já foi dito, lido e visto quanto a esse assunto, não quero entrar muito nos detalhes do livro, só dizer que ele é emocionante, bem escrito, detalhado e dá aquela sensação de "como a Humanidade pôde deixar algo assim acontecer?" ao mesmo tempo em que notamos uma certa "inocência" dos países invadidos, aceitando a palavras de um ditador psicopata como era Hitler.

Recomendo para quem gosta do tema e acho que é outro livro que deveria ser lido na escola porque o relato de quem viveu essa barbaridade é muito mais completo e mais preciso do que os livros de História nos mostraram ao longo dos anos.

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