sexta-feira, 17 de abril de 2015

O mundo como o conhecemos acabou! (Renata Lima)


Nossa Avaliação - 7.5

"A Vida Como Ela Era", da autora americana de 67 anos Susan Beth Pfeffer, publicado no Brasil pela Editora Bertrand Brasil, é o primeiro livro da série Os Últimos Sobreviventes. Ela conta com quatro livros distópicos muito diferentes das distopias que temos visto até hoje, apesar de trazer na capa uma alusão, muito equivocada, diga-se de passagem, à trilogia Jogos Vorazes.


Neste primeiro livro, através de diários, conhecemos Miranda, uma jovem vivendo o dia a dia de uma estudante do Ensino Médio que tem duas amigas: a periguete Sammi e a cristã fervorosa Megan, mas as três se afastaram bastante depois da morte de Becky por uma doença que não é nomeada, mas que eu acredito que tenha sido câncer. 

Miranda se sente um tanto solitária, já que seu irmão, e melhor amigo, Matt está na faculdade e o irmão mais novo, Jonny não pensa em outra coisa senão jogar beisebol quando for mais velho.

A normal e pacata vida de Miranda sofre uma pequena reviravolta quando o pai anuncia que sua segunda esposa, Lisa, está grávida. Apesar do divórcio e da distância, os pais de Miranda tem uma relação de amizade, a mãe está conhecendo o médico da cidade, Peter Elliot. Miranda acredita que todos têm alguém, menos ela e diz que sua vida está estagnada, mas tudo isso muda quando um asteroide colide com a lua.

Inicialmente aquele seria um fenômeno normal e os astrônomos não estavam preocupados porque asteroides atingiam a lua o tempo todo, embora esse fosse um pouco maior, mas o evento poderia ser visto a olho nu, então as pessoas começam a organizar festas nos telhados, montar telescópios nas ruas e nos noticiários não se fala em outra coisa. Mas na noite do dia 18 de maio quando o asteroide finalmente atinge a lua, os estragos são bem maiores do que os astrônomos previam e, além de bater na lateral lunar, o asteroide empurra a lua para mais perto da terra, inicialmente influenciando nas marés e gerando tsunamis por toda a costa mundial dizimando ilhas, cidades, estados e até mesmo países inteiros.

A proximidade da lua assusta bastante, mas na cidade de Miranda não há muita diferença a não ser o fato da maioria das emissoras de TV e rádio saírem do ar, assim como as linhas de telefonia fixa e celular não funcionarem, provavelmente devido ao congestionamento. No dia seguinte a lua ainda aparece no céu, mas todos seguem normalmente para a escola, mas uma tempestade nunca vista antes começa e a mãe de Miranda vai pegá-la na escola, levando-a direto para fazer compras emergenciais juntamente com Jonny e a vizinha, a idosa Sra. Nesbitt. O mercado está vendendo o carrinho cheio a 100 dólares, e é um leve o que puder, com pessoas brigando por causa de carrinhos e de produtos.

A gasolina começa a aumentar vertiginosamente e é aí que começa a negação da nossa personagem principal, achando que tudo vai ficar bem e que ninguém deixaria as pessoas sem gasolina para passar o inverno, dali a mais de seis meses.

Miranda é a típica americana mimada que só pensa em si mesma e é alheia aos acontecimentos ao redor do mundo, o que deixa o livro um tanto auto-centrado na figura dessa família, não dando uma visão mais ampla dos acontecimentos mundiais, a não ser pelos raros relatos da mãe, que ouve rádio quase todos os dias enquanto há transmissões. Claro, essa postura vai mudando com o passar do livro, mas há tantas discussões inúteis, atitudes infantis e frases do tipo "minha mãe ama mais Matt e Jonny", "tudo é para eles e nada para mim", "ela acha que eu sou fraca e não sobreviveria sozinha" que irrita e torna quase impossível a missão do leitor de se identificar com ela. O ápice foi "vai ser um verão quente sem ar-condicionado"... filha, o mundo está morrendo! 

Claro que com o tempo as coisas só pioram: a energia vai embora de vez, terremotos e maremotos começam a atingir outros lugares, mosquitos começam a disseminar doenças e, apesar disso tudo isso, Miranda ainda consegue levar uma relativamente normal e desenvolver uma relação afetiva com Dan, um rapaz de sua equipe de natação, até que os dias passam a ser mais escuros porque vulcões começam a entrar em erupção e a espalhar cinzas por toda a parte. Agora sim, a vida como ela era praticamente não existe mais!
Às vezes penso como a vida costumava ser. Nunca fui a lugar algum, não longe de verdade. Fui uma vez à Flórida e visitei Boston, Nova York, Washington, Montreal e só. Queria ir para a América do Sul, para a África. Sempre achei que isso seria possível algum dia. Mas meu mundo está cada vez menor. Sem escola. Sem lago. Sem cidade. Sem quarto. Agora não tenho nem mesmo a vista das janelas.
Com um estoque limitado de água e comida, com o inverno chegando e pulando refeições, nos preocupamos com essa família, com a família do pai de Miranda, com Peter e com a idosa sra. Nesbitt, que se recusa a deixar sua casa e ir para a casa de Miranda, mas ainda sim sentimos que o ritmo lento do livro prejudica a leitura. Em algumas partes eu me perguntava:  "sim, e daí?" para depois me lembrar que nem sempre tudo que se escreve num diário é relevante para outras pessoas.

Algumas partes do livro poderiam ser suprimidas, como por exemplo o encontro de Miranda com seu ídolo maior, o patinador Brandon, em um lago congelado. Nem ela mesma sabe se foi real ou imaginação, mas o fato é que ela fala em Brandon o livro todo e quanto finalmente tem a chance de encontrá-lo mais vezes, ela simplesmente para de ir até o lago, algumas vezes com motivo, mas outras vezes sem qualquer razão, no mínimo irrelevante para o resto da história.

O interessante desse livro é lê-lo nas entrelinhas através dos diálogos que Miranda tem com outras pessoas, como por exemplo o guarda que alerta que garotas não devem mais andar sozinhas pela cidade, e das cartas que chegam quando o pai dela e a esposa, Lisa, se arriscam a ir para o sul para ficaram com os pais de Lisa. As cartas falam sobre restrições de viagem, sobre milícias cercando fronteiras, sobre campos de refugiados, finalmente mostrando, mesmo que bem pouco, uma visão mais ampla da tragédia que se desenrola mundo afora.

A edição do livro é super bem feita e só encontrei uns poucos erros, como por exemplo trocar o nome do personagem de Jon para John uma ou outra vez, e um posicionamento duvidoso de vírgulas em frases muito pequenas, que são comuns no inglês. Fora isso, adorei o desenho da casa que abre todos os capítulos e as pequenas diferenças nesses desenhos que vão aos poucos se desintegrando à medida que o mundo também vai. Super interessante.

Como entretenimento, o livro é bom e vale a pena. Ouvi dizer que os livros posteriores são bem melhores, então já estou ansiosa pelo segundo volume. Espero que a Pandorga não demore muito a lançar!

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