segunda-feira, 14 de julho de 2014

Somos nossas memórias (Renata Lima)


Muito já foi dito sobre os romances de Chico Buarque e confesso que só li "Budapeste", que não me conquistou tando assim, por isso fui ler "Leite Derramado" com um pé na frente outro atrás sem nem saber exatamente do que se tratava o livro e sem procurar resenhas sobre ele.

Nossa Avaliação - 8.0
Praticamente internado para morrer de velhice, Eulálio Montenegro D´Assumpção conta a história de sua vida em primeira pessoa, elaborando o retrato da decadência aristocrática e das relações políticas pré e pós as Grandes Guerras. 

Narrado em primeira pessoa, entramos na mente de um senhor com Alzheimer que alterna dias de lucidez com dias de monótona repetição de tudo que já foi dito, começando quando descobriu que, com a Crise de 29, o dinheiro que a família investiu em café foi todo perdido.

Eulálio conversa continuamente conosco e os dias vão se alternando até parecerem um só e dentro de sua mente burguesa de criação, confusa e preconceituosa, as histórias vão se sucedendo e ao mesmo tempo se intercalando como uma conversa entre amigos que lembram e relembram fatos do passado muitas vezes com saudosismo, outras vezes com amargura, e muitas vezes o mesmo fato se desdobra, se funde, se estica, muda e traz novas nuances acerca de nosso personagem principal que poderia ser meu avô ou seu.

E é assim que Eulálio passa seus dias, evocando lembranças que ficaram esquecidas, esquecendo coisas que precisam ser lembradas, trazendo para o presente presenças e pessoas, rostos e sabores, aos poucos reconstruindo sua própria identidade, mesmo que em meio à solidão de estar abandonado e malcuidado em um hospital público.
"As pessoas não se dão ao trabalho de escutar um velho, e é por isso que há tantos velhos por aí, o olhar perdido, numa espécie de país estrangeiro." Pág. 78

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