A vingança das lobas (Carla Cristina Ferreira)

Como foi um tiro no escuro, havia a grande chance de o livro não ser bom, mas logo nas primeiras páginas me vi envolta em uma história de lobos, alquimistas e vingança. Os livros, que foram publicados aqui em 2004 pela Nova Fronteira, retratam uma época onde os senhores feudais exigiam o direito de passar a noite de núpcias com as mulheres de seu feudo. Para fugir dessa sina cruel, Isabel foge com seu marido, mas no caminho são capturados por Francisco de Charezon, senhor de Auvergne.

Nossa avaliação - 8.0

Já falamos aqui da grande vantagem de visitar sebos e em como achamos preciosidades garimpando por entre estantes, atrás de autores e histórias desconhecidas. Em uma visita ao sebo Baratos da Ribeiro, em Copacabana, me deparei com os dois volumes de “O Baile da Loba”, da francesa Mireille Calmel. Os dois livros saíram por R$ 30,00; o preço nas livrarias é de R$ 40,00 cada!

“A Câmara Maldita” não é apenas o nome do primeiro volume, mas também o local onde Isabel é surrada e estuprada sucessivamente por Charezon até ser jogada viva para os lobos. O que ele desconhece é que a família de Isabel possui uma estreita ligação com estes animais e após os rumores de que uma grande loba cinzenta anda atacando o povoado, o grande senhor feudal começará a temer por sua vida.

Paralelamente, a obsessão de Charezon em produzir a pedra filosofal (e por poder) fica tão evidente quanto à loucura que existe dentro dele. Seu egocentrismo, sua falta de escrúpulos e sua crueldade são assustadores.

Repleto de misticismo, intrigas, traições, paixões; o livro é de tirar o fôlego a cada virada de página, trazendo uma gama de personagens femininas com personalidades marcantes, corajosas e que não deixam se levar passivamente pela vontade dos homens.

Mireille cria uma idade média diferente onde os poderes da alquimia, da ciência e da astrologia se misturam em um mundo sobrenatural. O mesmo vale para os personagens fictícios que se relacionam com figuras históricas como um jovem Nostradamus, fazendo suas primeiras profecias e muitos outros no segundo volume “A vingança de Isabel”.

Nossa avaliação - 7.0

Como sempre, ao se tratar de continuações, é difícil falar da trama sem trazer spoliers do seu antecessor. O segundo livro tem um ritmo um pouco diferente do primeiro; eu diria que ele é divido em duas partes: enquanto a primeira é focada na vingança das mulheres-lobo, a segunda é uma busca desesperada para encontrar a cura para quebrar a maldição que elas carregam.

Aqui encontramos Maria, criada rodeada de segredos por todos os lados, que após descobrir a verdade sobre sua família, segue os passos de Isabel, mostrando-se destemida e persistente como ela.

Isabel, Albéria, Loralina e Maria – quatro mulheres corajosas que direta ou indiretamente vivem divididas entre o amor, o ódio e o desejo de vingar os horrores cometidos contra sua família. Unidas para destruir a fúria de um monstro, uma após a outra sacrificarão tudo para finalmente se verem livres de um pesadelo.

Até aqui o segundo volume segue a mesma linha do primeiro, mas depois de alcançado o clímax, a autora muda o foco da trama para a procura do antídoto que permitirá quebrar a maldição: é a vez de Isabel tentar criar o elixir da vida.

Mireille, que narra esplendorosamente tanto a pobreza quanto a riqueza da grande Paris, inclusive nos insere na corte do rei através de Maria, fica tão embevecida com esta reconstrução em alguns momentos, que a busca pelo antídoto passa para o segundo plano. E assim a história passa a ficar recheada de momentos da história do país como a luta entre católicos e luteranos, e o casamento de Catarina de Médici.

Aos poucos a magia vai saindo de cena e a realidade histórica da época vai tomando conta da trama, esquecendo-se de Isabel, Albéria, Loralina e seus sofrimentos. Mas ainda assim, Mireille consegue criar um universo fantástico no qual mulheres fortes tentam tomar as rédeas de suas vidas. Isso em uma época em que deveriam ser submissas e seus anseios e desejos deveriam ser postos de lado.

Para um tiro no escuro, valeu muito a pena.